segunda-feira, 7 de setembro de 2009


EXPOSIÇÃO O VERMELHO - «O TANGO»


Miguel Baganha, acrílico s/ tela | 2009
81x64 cm- série: Fragmentos do Visível II

MEMÓRIA BREVE
DE UM TANGO PERDIDO

A esquina, o canto, o ângulo recto de um chão enviesado, o vermelho e o negro, como em Stendhal, pena de ferro fino crispada sobre o papel poroso, todo o ruído num só fio rasurado mas inteiro - e a dança procurada dos dedos invisíveis, apenas o aparo em jeito de lança antiga, preto, branco e vermelho, memória breve de um tango perdido, aqui encoberto pelos fragmentos minimalistas das suas cores emblemáticas, românticas, a prumo ou na horizontal, a escrita cursiva, itálica, bordando alguns limites escuros, lisos ou texturados, e ainda os panos dos teatrinhos de zarzuela, flamengo em Granada, as praças de Buenos Aires, desertas sob a bota militar, gente perdida e assassinada, corpos cinzentos atirados para as valas comuns que só há pouco as mães dilaceradas descobriram, impossibilitadas de encontrar nas fardas e nos ossos, o rosto forte dos seus filhos. Praças amplas como as de Chirico, atravessadas de sombras negras, oblíquas, ameaça visual que uma menina, inocente, não conhece, fazendo rolar o arco sob os contrastes da luz branca, solar, e a sombra côncava debaixo das arcadas, como acontece na Lua que já sabemos como é, nem plácida nem escura: os poetas cantavam-na, em tabernas e espaços nocturnos, ouvindo os sapatos das mulheres, vendo as suas blusas vermelhas, os seus folhos negros, uma coxa avançando, branca, e logo se escondendo, enquanto as botas dos homens, pretas e luzidias, traçavam o espaço e assentavam no chão, num rodopio do sonho ou do desejo, e em tudo isso, afinal, uma geometria secreta como a que se expõe e se oculta nestes planos negros, nestas faixas vermelhas, no brilho branco das camisas, equilíbrio trenário que submeteu o nosso olhar à vertigem das curvas, à doce violência de um enlace pela dinâmica, corpos em contra-luz, negro partilhado com o vermelho, branco com o apagamento do gesto petrificado. Também nestas telas o mundo se petrifica, as medianas e as diagonais sugerem a ordem pelo absoluto, são igualmente absurdas na inutilidade do seu espectáculo mínimo, só elas fingindo uma rasura textural em certas arestas, o espaço do silêncio entretanto, a completa imobilidade, o completo esquecimento das grandes bandeiras totalitárias.

Se Chirico ressuscitasse e viesse visitar estes espaços, na dureza do quase nada, haveria de desenhar uma menina que ele criou e ali costuma passar, o aro de metal barulhando devagar no empedrado de outrora.

Rocha de Sousa
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EXPOSIÇÃO TEMÁTICA DE PINTURA,
DESENHO, GRÁFICA ORIGINAL E OBJECTOS














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INAUGURAÇÃO: DIA 17 DE SETEMBRO ÀS 19:30
NA GALERIA PROVA DE ARTISTA

Artistas participantes:

Pilar Garcia
Abril, Miguel Baganha
, Joaquín Capa, Ming Yi Chou, José Manuel Círia, Manuela Cristóvão, Francisco Ferreras, Teresa Herrador, Saskia Moro, Lucy Pereira, Mário Rita, Daniela Rocha, Maria Luisa Sanz


TERÁ LUGAR UM ESPECTÁCULO DE TANGO ÀS 20:30h
DOS PRINCÍPIOS DO SÉCULO XX AOS ANOS 30:


Milonga
“Negra Maria” por Manuel Meanos e Lucio Demare

(Intérprete: Mercedes Simone)

Tango – “Felícia” por Carlos Pacheco e Enrique Saborido

(Intérprete: Trio Gonzalito)

Milonga – “El Porteñito” por Manuel Meanos e Angel Villoldo

(Intérprete: Carlos Garcia))

Canyengue – “Zorro Gris” por R. Tuegols e F. Garcia Jiménez

Tango Canção – “El dia que me quieras” por Enrique Ugarte

(Intérprete ao vivo: Vera Neves

DOS ANOS 40 ATÉ AOS NOSSOS DIAS:

Valsa Criolla – “La Tapera” por Edgardo Donato

Tango – “Millongueando en el 40por Aníbal Troilo

Tango Canção – “Balada para un loco” por Astor Piazzolla

(Intérprete ao vivo: Vera Neves)

Tango – “Orgullo Criollo” por Astor Piazzolla

Direccção e Coreografia: Miriam Nieli

Intérprete Vocal: Vera Neves

Dançarinos: Adriana Fernandes, Carlos Silva; Dalila Romão, Hugo Messias; Maria Elisabete Rosa, Vítor Conde; Maria Manuela Azevedo, Francisco Lebre; Noémia Liebaut, António Santos; Tatiana Ecetova, João Sabino.

Rua Tomás Ribeiro, 115 - Loja 1
1050 - 228 Lisboa
Telef.: 21 319 95 51
Móvel: 91 788 59 91
e-mail: provartista@gmail.com
Segunda a Sexta: 10:30 - 20:00
Sábado:15:00 - 20:00

2 comentários:

naturalissima disse...

Bela apresentação.
Dizer mais o quê se as palavras de Rocha de Sousa nos dizem tudo.

Parabéns por fazeres parte de um grande grupo de artistas... Sente-se que esta exposição será um marco importante na tua vida artistica.

Sempre estive e continuarei a estar ao teu lado, acreditando em ti ;-)

Com amor
Daniela

Rocha de Sousa disse...

Estas coisas tocam o nosso ser mas
não escapam ao domínio do relativo
ou à relação do paradoxo, sequer à
autonomia das escritas. Nem o meu
texto «ilustra» estes quadros, nem
estes quadros se encotram com o meu texto. A montagem no blog re- força a inexistência de um intuito analítico ou crítico. A indepen- dência dos autores está bem demar- cada: eu tomo o motivo para dizer o mundo de algumas das minhas an- siedades e entendimento dos dos ri-
tmos, das imagens passando no sub-
tecto da minha consciência, da mi-
nha memória; o Miguel «despintou»
um tango a negro e vernelho, aber-
to às culturas alheias. Se eu ti-
vesse escrito apenas sob as compo-
sições minimalistas, poderia fazer
uma bela aproximação «académica»,
mas nunca diria o que o tango me
desperta para lá da razão pictóri-
ca e acabaria servindo mal o «si-
lêncio» e as «ausências» daqueles
quadros. E, no entanto, há uma es-
quina que os começa.
ritmos